sábado, 18 de junho de 2011

ARTIGOS SOBRE ARQUITETURA PRISIONAL

ARQUITETURA PRISIONAL, A CONSTRUÇÃO DE PENITENCIÁRIAS E A DEVIDA EXECUÇÃO PENAL
Sandra Mara Garbelini
Sumário: Introdução; 1. Histórico; 1.1. O Modelo Panóptico; 1.2. O Sistema Americano; 2. Arquitetura Prisional no Brasil; 3. Regras atuais sobre Arquitetura prisional no Brasil; 4. A falta de políticas públicas impede a construção de penitenciárias para a devida execução penal; 5. Conclusão.

Resumo: O presente texto versa sobre a importância da Arquitetura prisional para a devida execução penal. O texto procura traçar o histórico das prisões a partir do surgimento da civilização, destacando os modelos panóptico e americano que inspiraram a maioria dos projetos arquitetônicos na construção das penitenciárias. Aborda, também, o histórico do Sistema Penitenciário do Brasil. Colaciona as principais regras atuais sobre Arquitetura prisional no Brasil, presentes no ordenamento jurídico nacional. Discute, ainda, a questão da falta de políticas criminais e penitenciárias na construção das penitenciárias para a devida execução penal. Finaliza por discutir a eficácia da forma de encarceramento atual no Sistema Penitenciário, sem contudo exaurir o tema.

Palavras-Chave: Arquitetura; penitenciárias; histórico; Lei de Execução Penal; Sistema Prisional

Introdução

A Arquitetura prisional está intrinsecamente ligada à própria história do surgimento da prisão e a sua generalização como única forma de punir, adotada pela maioria dos países através da privação da liberdade do indivíduo em um determinado espaço regido pela variável tempo.
A análise sobre a Arquitetura prisional revela que a prisão não adveio de um projeto, mas de um surgimento fático que depois tentou se aperfeiçoar através do planejamento com idéias e regras, as quais acabaram por se incorporar nos Tratados, nas Convenções Internacionais, na legislação, resoluções, etc.
A realidade ao longo dos séculos demonstra que as idéias, os projetos e as regras sempre estiveram dissociadas da realidade carcerária, na medida em que os reclusos sempre foram e continuam sendo excluídos pelo Poder Público e pela própria sociedade a exemplo do Brasil.
A falta de efetivação de políticas criminais e penitenciárias neste campo conduz a questão penitenciária a vários retrocessos. A Arquitetura de alguns estabelecimentos penais hodiernos se apresenta pior que aqueles do século XVI, sem contar que o cumprimento de pena nas Cadeias Públicas pelo interior do Brasil em condições absolutamente subumanas e degradantes faz qualquer preso sentir inveja do seu ancestral macaco que, em alguns casos, vive em melhores condições em sofisticada e individualizada jaula de famosos zoológicos freqüentados pela população.
Este texto pretende refletir sobre a Arquitetura prisional na construção de penitenciárias desde os precursores da idéia e a sua importância para a devida execução penal, além de levantar a tormentosa questão do quadriculamento da pessoa como forma de punir e ressocializar já em pleno século XXI da era tecnológica.
O primeiro item discorre sobre o histórico da prisão a partir do surgimento da civilização até a atualidade, destacando os modelos panóptico e americano na construção das penitenciárias.
Em um segundo momento, retrata a evolução do Sistema Penitenciário no Brasil, colacionando no item terceiro as principais regras presentes no ordenamento jurídico atual quanto à
Arquitetura prisional.
No quarto item, discute-se como a falta de políticas públicas em sede das questões criminais e penitenciárias impede a construção de penitenciárias para a devida execução penal.
Ao final, uma proposta de reflexão sobre o Sistema Penitenciário atual e as suas perspectivas para o futuro.
1.Histórico
Ao buscar a origem da prisão a partir do surgimento da civilização, constata-se que na Antigüidade, mais precisamente na Roma Antiga prevaleciam as penas corporais e de morte, sendo que a prisão constituía meio para encarcerar os acusados somente até o julgamento ou execução.
Naquela época, não existia um local certo com uma Arquitetura prisional definida para recolher os encarcerados, os quais ficavam geralmente em fortalezas reais, calabouços, torres ou edifícios diversos. Messuti (2003, p. 28) registra que existiam em Jerusalém quando houve a invasão dos caldeus, três prisões que se localizavam uma no portal de Benjamin, outra no palácio do rei e a última na residência de um funcionário público.
Afora estas experiências isoladas de prisão, segundo Leal (2001, p. 33) foi a Igreja que, na Idade Média, inovou ao castigar os monges rebeldes ou infratores com o recolhimento em celas localizadas em uma ala própria do mosteiro com o fim de recolhimento e oração.
A Idade Média, também, é marcada pelo aspecto estritamente punitivo da pena através do sofrimento físico corporal infligido aos acusados para libertação da alma com os suplícios, a forca, a roda.
No século XVI, com a crise do sistema feudal e a migração da população dos campos para as cidades com cenário de pobreza e miséria na Europa, o aumento da criminalidade foi inevitável e forçou a construção de várias prisões para segregar mendigos, prostitutas e vagabundos com o fim disciplinar e corretivo através do trabalho, especialmente pelos crimes cometidos contra o patrimônio que não se solucionariam com a pena de morte que fatalmente exterminaria milhares de delinqüentes assolados pela fome.
Nesta época, a prisão mais antiga de acordo com Leal ( 2001, p. 34) foi a House of Correction, inaugurada em 1552 na cidade de Bridewell, na Inglaterra, com disciplina extremamente rígida para emenda dos delinqüentes.
Outro modelo de inspiração para época foi o de Rasphuis de Amsterdam, inaugurado em 1596, onde o trabalho era obrigatório, a cela individual era utilizada somente a título de punição com vigilância contínua e leituras espirituais.
Percebe-se, desta forma, que a prisão surgiu para a segregação de mendigos, prostitutas e vagabundos, fato sociológico que merece registro pela atualidade da problemática da população carcerária atual, não se olvidando da sua finalidade: corretiva através do labor.
A partir desta época, começou a se desenvolver estudos e idéias sobre o sistema penitenciário, especialmente a preocupação com a questão humanitária da prisão, destacando-se dentre os mais importantes: a obra Reflexões sobre as prisões monásticas de Jean Mabillon (1695), o clássico revolucionário Dos Delitos e das Penas de Cesare Beccaria (1764), O Estado das Prisões na Inglaterra e no País de Gales de John Howard (1776).
No ano de 1818, foi editado Teoria das Penas e das Recompensas de Jeremias Bentham autor do modelo panóptico, que merece consideração especial no desenvolvimento da Arquitetura prisional.

1.1. O Modelo Panóptico
Registra-se que, no século XIX, aparece a idéia da técnica do quadriculamento do indivíduo e segundo explica Foucalt ( 1.987, p. 165), com o surgimento da peste e o controle sobre a população utiliza-se processos de individualização para os excluídos – isso é o que foi regularmente realizado pelo poder disciplinar desde o começo do século XIX: o asilo psiquiátrico, a penitenciária, a casa de correção, o estabelecimento de educação vigiada, com o emprego de técnicas para medir, controlar e corrigir os anormais.
Neste cenário, surge o Panóptico de Bentham universal para todos aqueles estabelecimentos (penitenciárias, escolas, fábricas...) com as seguintes formas: na periferia uma construção em anel com várias celas que possuem duas janelas uma para o interior e outra para o exterior. No centro, uma torre com várias janelas que abrem para o interior do anel, onde o vigia possui visibilidade sobre os detentos sem estes o enxergar.
O panóptico constitui um aparelho Arquitetural, onde os detentos são vistos e devem ter certeza que são o tempo todo vigiados e nunca vêem nada, pois haveria persianas na sala central e separações que são biombos através de um método inverificável, qual seja o detento nunca deve saber se está sendo observado, mas deve ter certeza de que sempre pode sê-lo.
Bentham se maravilha da leveza do panóptico: o peso das velhas casas de segurança, com sua Arquitetura de fortaleza, é substituído pela geometria simples e econômica de uma casa de certeza.
Cogita-se que o panóptico poderia ter sido inspirado no projeto do primeiro zoológico mundial o de Versalhes, o qual proporcionava a organização analítica da espécie, o fato é que o poder de observação sobre os detentos constitui a sua principal característica sugestiva até mesmo para experimentos humanos diversos.
Na visão de Foucalt (1987, p. 172), o panóptico aparece como jaula cruel e sábia, vez que abandona os suplícios, os castigos pelo poder da observação, um puro sistema Arquitetural e óptico e polivalente em suas aplicações: serve para emendar os prisioneiros, mas também para cuidar dos doentes, instruir os escolares, guardar os loucos, fiscalizar os operários, fazer trabalhar os mendigos e ociosos, seria um tipo de implantação de corpos no espaço.
Nota-se, pois, o poder disciplinar através de uma simples idéia Arquitetural. A disciplina prevalece sobre a soberania com a subordinação dos corpos. A física benthamiana do poder se exaure na seguinte fórmula: utilização da disciplina para economia em um tempo que se necessita fabricar indivíduos úteis para a produção manufatureira.
A grande explosão demográfica do século XVIII com a necessidade do aumento da produção faz do panóptico o modelo para a disciplina.Percebe-se, aqui, uma mudança da punição que antes eram os castigos por punir, agora é o poder disciplinar de vigiar através de um poder direto e físico que os homens exercem sobre os outros.
Uma generalização de estilo que marcou o século XVIII e estendeu influência até hoje.
Com efeito, o panóptico tornou-se, por volta dos anos 1830-1840, o programa Arquitetural da maior parte dos projetos de prisão. Nota-se a influência do sistema panóptico, também, nos registros individuais dos detentos através da observação e vigilância até a atualidade.
No fim do século XVIII e início do século XIX, a pena de prisão continua sendo a peça essencial da punição, visando a transformação dos indivíduos pelo poder disciplinar e o trabalho. A prisão generalizou-se como castigo legal. Registra-se, no ano de 1844, a Arquitetura de Petite Roquette, onde pela primeira vez na França foi organizado o encarceramento celular através do isolamento do indivíduo em cela individual pela Lei nº 1844 que estabelecia o internamento celular. Seguiam-se os estudos para o desenvolvimento do Direito Penitenciário, especialmente na Europa e nos Estados Unidos.
1.2.Sistema Americano
O modelo de Filadélfia.
Criado em 1790 a prisão de Walnut Street, modelo de confinamento solitário em celas individuais com base no arrependimento e na leitura da bíblia. O modelo inspirou várias prisões nos Estados Unidos e especialmente na Europa. Na prisão pensilvaniana as únicas operações da correção são a consciência e a
Arquitetura muda contra a qual ela esbarra.
O modelo de Auburn
O modelo de Auburn inaugurado na penitenciaria de Auburn, Nova York, em 1816, prescreve a cela individual durante a noite, o trabalho e as refeições em comum, mas, sob a regra do silêncio absoluto. A prisão deve ser um microcosmo de uma sociedade perfeita sem relacionamento lateral com a Arquitetura sempre preocupada com a segurança.
Para Leal (2003, p. 36), os dois sistemas – pensilvânico e auburniano- começaram a declinar e abriram caminho para novas propostas que buscariam diminuir suas falhas e limitações, ocasião em que surge o sistema progressivo, a conduta e o trabalho sendo utilizados como meios de avaliação e preparação para a vida em liberdade, cujo precursor foi o Coronel Manuel Montesinos y Molina (1796-1862), na Espanha.
A partir do século XIX, houve o desenvolvimento do Direito Penitenciário a nível mundial, tendo a preocupação com a questão se transformado em Congressos Internacionais Penitenciários e, após, para Congressos Internacionais Penais e Penitenciários, que ocorreram em Praga (1930), Berlim (1935) e Haia (1950).
Assinala Leal (2003, p. 44) que a partir de 1955, tiveram início, sem interrupção até o presente, Congressos qüinqüenais das Nações Unidas sobre Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente, sendo aquele realizado em Havana em 1990, que estabeleceu as regras mínimas para o tratamento do preso.

2 Arquitetura Prisional no Brasil
A história do sistema penitenciário no Brasil revela que, desde o início, a prisão foi local de exclusão social e questão relegada a segundo plano pelas políticas públicas, importando, conseqüentemente, a falta de construção ou a edificação inadequada dos edifícios penitenciários, na maioria das vezes improvisados.
Estabelecia o Livro V das Ordenações Filipinas do Reino, Código de leis portuguesas que foi implantado no Brasil durante o período Colonial que “decretava a Colônia como presídio de degredados” . A pena era aplicada aos alcoviteiros, culpados de ferimentos por arma de fogo, duelo, entrada violenta ou tentativa de entrada em casa alheia, resistência a ordens judiciais, falsificação de documentos, contrabando de pedras e metais preciosos.
A utilização do território colonial como local de cumprimento das penas se estende até 1808, ano marcado por mudanças significativas rumo à autonomia legal e aos anseios de modernidade, tão em voga naqueles tempos, segundo assinala Pedroso. A instalação da primeira prisão brasileira é mencionada na Carta Régia de 1769 , que manda estabelecer uma Casa de Correção no Rio de Janeiro.
Registra-se, também, a Cadeia construída na cidade de São Paulo entre 1784 e 1788, conhecida simplesmente como Cadeia e estava localizado no então Largo de São Gonçalo, hoje Praça João Mendes. Era um grande casarão assobrado, onde funcionava também a Câmara Municipal. Na parte inferior, existiam as salas destinadas à prisão e, no piso superior, os espaços para as atividades da Câmara. Para lá eram recolhidos todos os indivíduos que cometiam infrações, inclusive escravos, e era onde aguardavam a determinação de penas como o açoite, a multa e o degredo; uma vez que não existia, ainda, a pena de prisão.
A Constituição de 1824 estabelecia, no art. 179, que as prisões deveriam ser seguras, limpas, arejadas, havendo a separação dos réus conforme a natureza de seus crimes. O Código Criminal de 1830 estabeleceu a pena de prisão com trabalho para vários crimes, implicando a construção de Casas de Correção com celas individuais e oficinas de trabalho e uma Arquitetura própria para a pena de prisão. O café e a industrialização proporcionavam um estímulo cada vez maior para o crescimento populacional e também econômico do país, mas as casas de recolhimento de presos do início do século XIX mostravam condições deprimentes para o cumprimento da pena por parte do detento, inclusive local onde se recolhiam escravos, menores e loucos.
O Código Penal de 1890 estabeleceu novas modalidades de penas: prisão celular, banimento, reclusão, prisão com trabalho obrigatório, prisão disciplinar, interdição, suspeição e perda do emprego público e multa. O artigo 44 do Código considerava que não haveria penas perpétuas e coletivas. As penas restritivas de liberdade individual eram temporárias e não deveriam exceder trinta anos, eram elas: prisão celular, reclusão, prisão com trabalho obrigatório e prisão disciplinar.
A prisão celular, inspirada no modelo pensilvânico e de Roquete foi a grande novidade da revisão penal de 1890 e foi considerada punição moderna, base Arquitetural de todas as penitenciárias. No entanto, o aumento gradativo e constante da população carcerária confrontou-se com as limitações de espaço das prisões, inviabilizando o direito à cela individual. No interior do país o problema alcançou dimensões grandiosas e por muitos anos e que nem o Código Penal de 1940 conseguiu apaziguar, segundo assinala Brito:
"dada a insuficiência das prisões municipais onde se acumulam, entre paredes e grades, homens de todas as condições sociais, e até menores, mulheres e loucos. E o que mais chocante é, muitas delas de fachadas modernizadas, por exigências de urbanismo, mas cujo interior vale por um excárneo e por um contraste desalentador do que se mostra fora. " (BRITO, 1947, p.442).
Registra-se que no século XIX já existia uma sociedade para melhoria das prisões, um movimento para torna-la mais eficaz.
No século XX, começaram os primeiros estudos para a elaboração de uma legislação penitenciária, conforme ressalta Barbosa ( 1993, p. 87), mencionando que em 1937 elaborou-se o Projeto de Código Penitenciário pelos juristas Cândido Mendes, Lemos Brito e Heitor Carvalho, enquanto em 1957 outro Anteprojeto de Código Penitenciário foi elaborado por Oscar Stevenson e em 1963, o Professor Roberto Lyra elaborou o Anteprojeto de Código de Execuções Penais.
No entanto, nenhum destes Anteprojetos vingou, vindo a ser promulgada em 1984 a Lei nº 7.210, que estabeleceu sobre a execução penal, fruto de comissão nomeada pelo então Deputado Abi-Ackel, marco do Direito Penitenciário no país.

3. Regras atuais sobre Arquitetura prisional no Brasil
A Arquitetura dos estabelecimentos prisionais, conforme já assinalado, implica a observância dos próprios direitos dos indivíduos que serão encarcerados dentro de um prédio que além dos projetos hidráulico, elétrico, deve conter o projeto normativo de acordo com as regras de execução penal em vigor no país, as quais passa-se a colacionar.
Dispõe a Constituição Federal em seu art. 5º:
III- ninguém será submetido a tratamento desumano ou degradante.
XLVIII – a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado
XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral
As Regras Mínimas para o Tratamento do Preso no Brasil recomendada pelas Nações Unidas foi regulada pela Resolução nº 14 de 11 de novembro de 1994 pelo CNPCP (Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária), que no tocante à Arquitetura assim dispôs:
Capítulo IV
DOS LOCAIS DESTINADOS AOS PRESOS
Art. 8º. Salvo razões especiais, os presos deverão ser alojados individualmente.
§ 1º. Quando da utilização de dormitórios coletivos, estes deverão ser ocupados por presos cuidadosamente selecionados e reconhecidos como aptos a serem alojados nessas condições.
§ 2º. O preso disporá de cama individual provida de roupas, mantidas e mudadas correta e regularmente, a fim de assegurar condições básicas de limpeza e conforto.
Art. 9º. Os locais destinados aos presos deverão satisfazer as exigências de higiene, de acordo com o clima, particularmente no que ser refere à superfície mínima, volume de ar, calefação e ventilação.
Art. 10º O local onde os presos desenvolvam suas atividades deverá apresentar:
I – janelas amplas, dispostas de maneira a possibilitar circulação de ar fresco, haja ou não ventilação artificial, para que o preso possa ler e trabalhar com luz natural;
II – quando necessário, luz artificial suficiente, para que o preso possa trabalhar sem prejuízo da sua visão;
III – instalações sanitárias adequadas, para que o preso possa satisfazer suas necessidades naturais de forma higiênica e decente, preservada a sua privacidade.
IV – instalações condizentes, para que o preso possa tomar banho à temperatura adequada ao clima e com a freqüência que exigem os princípios básicos de higiene.
Art. 11. Aos menores de 0 a 6 anos, filhos de preso, será garantido o atendimento em creches e em pré-escola.
Art. 12. As roupas fornecidas pelos estabelecimentos prisionais devem ser apropriadas às condições climáticas.
§ 1º. As roupas não deverão afetar a dignidade do preso.
§ 2º. Todas as roupas deverão estar limpas e mantidas em bom estado.
§ 3º. Em circunstâncias especiais, quando o preso se afastar do estabelecimento para fins autorizados, ser-lh-á permitido usar suas próprias roupas.
A Lei nº 7.210/84 ( Lei de Execução Penal), estabelece em seu art. 64 que ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, no exercício de suas atividades, em âmbito federal ou estadual, incumbe:
VI - estabelecer regras sobre a Arquitetura e construção de estabelecimentos penais e casas de albergados;
As diretrizes para elaboração dos projetos e construção de unidades penais no Brasil foram estabelecidas pelo referido Conselho através da Resolução nº 16 de 12 de dezembro de 1994, cujos pontos relevantes para os projetos arquitetônicos destacam-se:
a fixação da capacidade máxima dos estabelecimentos prisionais em 500 (quinhentos) presos a fim de acabar com as cidades-presídios;
a previsão para todo projeto de estabelecimento penal de locais para: assistência religiosa e culto; ensino e biblioteca; prática de esportes e lazer; oficinas de trabalho; enfermaria; visitas reservadas aos familiares; serviço jurídico; assistência social; assistência médica-odontológica; solário.
Anota-se, neste ponto, que de acordo com o art. 71 da Lei de Execução Penal, coube ao Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) prestar apoio administrativo e financeiro ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, com atribuição para acompanhar a fiel aplicação das normas de execução penal em todo território nacional, inclusive na construção dos estabelecimentos prisionais.
No seu Título IV, a Lei de Execução Penal trata dos Estabelecimentos Penais que, conforme a sua natureza, deverá contar em suas dependências com áreas e serviços destinados a dar assistência, educação, trabalho, recreação e prática esportiva (art. 84), ainda que o preso provisório ficará separado do condenado por sentença transitada em julgado.
O art. 85 estabelece que o estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade e seguindo o isolamento individual, prevê o art. 88:
Art. 88. O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório.
  Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular:
  a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana;
  b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).
Quanto à Colônia Agrícola, Industrial ou Similar destinada ao cumprimento da pena em regime semi-aberto de acordo com o art. 91, estabelece que o condenado poderá ser alojado em compartimento coletivo, observados os requisitos da letra a, do parágrafo único, do artigo 88, desta Lei e, ainda, como requisitos básicos das dependências coletivas: a seleção adequada dos presos e o limite de capacidade máxima que atenda os objetivos de individualização da pena.
Ainda, sobre a Cadeia Pública estabeleceu o art. 102 da Lei de Execução Penal que destina-se ao recolhimento de presos provisórios.
A recente Resolução nº 16 de 17 de dezembro de 2003 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, que dispõe sobre as diretrizes básicas de política criminal quanto à prevenção do delito, administração da justiça criminal e execução das penas e das medidas de segurança, dispõe no seu art. 6º referente à administração penitenciaria e Arquitetura prisional:
I - construção preferencial de unidades, com no máximo 500 vagas, buscando-se evitar a permanência de presos condenados e provisórios em delegacias de polícia
II – cumprimento de pena privativa de liberdade em estabelecimentos prisionais próximos à residência da família do condenado;
Menciona-se, ainda, a Lei Complementar nº 79/1994, que criou o Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN), cujos recursos serão aplicados, dentre outros, na construção, reforma, ampliação e aprimoramento de estabelecimentos penais de acordo com o art. 3º, I.
Este percurso histórico e normativo se fez necessário para visualizar que regras foram editadas e se encontram em plena vigência, mas políticas públicas nunca foram realmente implementadas para devida efetividade das normas constitucionais, legais e administrativas acima colacionadas para a devida execução penal.
De fato, o sistema penitenciário sempre foi objeto de discussões e inquietação social, resultando na edição do arcabouço normativo acima colacionado que se efetivamente implementado garantirá a devida execução penal, vez que os preceitos cominados, em tese, indicam o respeito à dignidade do preso e a possibilidade de sua “ressocialização”através de um ambiente saudável e com oferecimento de trabalho, assistência à saúde, alfabetização, dentre outros.
Ocorre que, entre as normas em destaque e a realidade existe um imenso vazio, onde o Sistema Penitenciário indica superpopulação carcerária, estabelecimentos penitenciários em ruínas, fugas, cumprimento de penas em cadeias públicas, falta de hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, enfim, um completo descaso das políticas criminais que revelam um distanciamento enorme entre a execução penal legal e a execução penal fática que animaliza, regride e devolve o recluso em piores condições à sociedade e, ainda, com a marca e o trauma do sistema penitenciário nacional.
Nota-se que a Arquitetura prisional hodierna continua a indicar o alojamento em celas individuais, as oficinas de trabalho com a inovação da capacidade máxima de 500 (quinhentas) vagas, primando sempre pela segurança e disciplina.

4. A falta de políticas públicas impede a construção de penitenciárias para a devida execução penal.
No Brasil, apesar das conquistas sociais da Constituição Federal de 1934, o Estado do Bem-Estar Social não chegou a se implantar no país, bem como no restante da América Latina e, na visão de Hobsbawn (apud Streck, 2004, p. 63) o Brasil seria “um monumento à negligência social.”
Ao compartilhar desta idéia, Bonavides ( 2004, p. 30) assinala que socialmente, o Brasil é o País mais injusto do mundo; por um paradoxo, sua riqueza fez seu povo mais pobre e suas elites mais ricas numa proporção de desigualdade que assombra cientistas sociais e juristas de todos os países.
No entanto, após o fim da ditadura militar e a implantação da democracia, chegou, também, ao território nacional o neoliberalismo com a idéia da globalização através de um discurso econômico e relativação da soberania estatal em um país endividado externamente e subjugado às cobranças de juros ferozes, dívida esta que, na visão de Bonavides (2004, p. 04) sufoca o contribuinte, empobrece o país, quebra o erário, esparge a decadência e a miséria no seio das classes sociais.
Com efeito, não se pode negar que a exclusão social assistida tem um de seus fatores na política neoliberal praticada quando o Estado passa a ver a economia com âmbito mundial em detrimento das necessidades sociais. Barroso (2001, p. 7) acrescenta que o “Estado passou a ser o guardião do lucro e da competitividade”
A realidade neoliberal que assola o país, acusa a impossibilidade de políticas públicas criminais e penitenciárias, vez que não se justificaria aos olhos dos investidores externos e dos grupos econômicos internacionais, o dispêndio de milhões na construção de penitenciarias para a execução penal digna que exige a própria legislação nacional.
A sociedade entoa o mesmo discurso quando se insurge contra a construção de presídios se faltam escolas e hospitais para atender a demanda e, desta forma, os reclusos são excluídos do sistema e olvidados sempre pelas políticas públicas. Na lúcida visão de Santos (2004, p. 83), a economia passa, então, a ser a detentora das linhas políticas e institucionais do país, sendo que, de um lado a Constituição Federal destaca as garantias fundamentais e os direitos individuais e sociais, de outro, as regras econômicas limitam o Estado a não praticar políticas públicas que garantam a eficácia desses direitos retratados na Constituição e na legislação infraconstitucional.
Irônico que o poder econômico ainda se aproveita economicamente da delinqüência que centrada na prisão, segundo Foucalt (1987, p. 232) representa um desvio de ilegalidade para os circuitos de lucro e de poder ilícitos da classe dominante, v.g., das empreiteiras de engenharia, firmas de segurança e equipamentos, dentre outros.
Deste modo, ante a ausência de políticas sérias e investimentos no sistema penitenciário brasileiro, as velhas e insalubres instalações penitenciárias, além daquelas superlotadas efetivamente não atingem o desiderato último da pena que é a ressocialização do indivíduo que, na maioria das vezes, sequer era socializado e sempre foi excluído socialmente pelo poder público.
Segundo Leal (2003, p. 40) não se pode ensinar no cativeiro a viver em liberdade, descabendo cogitar-se de ressocializar quem de regra nem sequer foi antes socializado. Na atualidade nacional, recolhem-se os presos a locais piores que os calabouços antigos, aglomeram-se pessoas em cubículos e retira-lhes a dignidade, animaliza, em cenário pior que o zoológico da cidade.
Se o aprisionamento em si com a constrição da liberdade do indivíduo já constitui medida drástica para qualquer ser humano, o seu enquadriculamento em celas coletivas e condições indignas, não difere dos antigos suplícios da Idade Média.
Importante destacar, ainda, que o indivíduo privado de sua liberdade temporariamente não se encontra privado de seus direitos garantidos constitucionalmente como a dignidade da pessoa humana.
Assinala Foucalt ( 1987, p. 215) que a passagem dos suplícios, com seus rituais de ostentação, com sua arte misturada à cerimônia do sofrimento, a penas de prisões enterradas em
Arquiteturas maciças, não é passagem a uma penalidade indiferenciada, abstrata e confusa; é a passagem de uma arte de punir a outra, não menos científica que ela. Mutação técnica.
Vivemos atualmente um retrocesso Arquitetural
, prova disto é o resgate do isolamento pensilvânico pelo RDD (Regime Disciplinar Diferenciado), através da solidão e do silencio do antigo e ineficaz modelo filadélfico.
Por outro lado, faltam as políticas públicas adequadas que o sistema econômico globalizado e subjugador do terceiro mundo não permite implantar em total menosprezo com o detento.
De fato, a reforma penitenciária nacional deve iniciar pela Arquitetura das prisões, conforme assinala Mirabete (2000, p. 248). Já se tem afirmado que uma autêntica reforma penitenciária deve começar pela Arquitetura das prisões. Entretanto, nos dias de hoje, no recinto das prisões, respira-se um ar de constrangimento, repressão e verdadeiro terror, agravado pela Arquitetura dos velhos presídios em que há confinamento de vários presos em celas pequenas, úmidas de tetos elevados e escassas luminosidade e ventilação, num ambiente que facilita não só o homossexualismo como o assalto sexual.
A Arquitetura de velhos presídios e cadeias públicas espalhados pelo país, efetivamente não se difere de um zoológico (as grades, o confinamento), com celas superlotadas de seres humanos em piores condições que os animais habitantes das jaulas do próprio zoológico, sem individualidade, respeito e subjugados aos presos mais fortes.
Interessante que desde o modelo panóptico não se evoluiu muito na Arquitetura prisional que continua com aquela conotação corretiva e disciplinar dos séculos passados, sendo que até a conotação utilitária através do trabalho foi abandonada diante da falta de oferecimento de trabalho aos detentos em muitos estabelecimentos prisionais. Pouco se evoluiu.
Para Zaffaroni: “La prisión o jaula es uma institución que se comporta como uma verdadera máquina deteriorante: genera uma patología cuya caratecterística más saliente es la regresión, lo que nos es difícil de explicar.” (1992, p. 52).

4. A falta de políticas públicas impede a construção de penitenciárias para a devida execução penal.
No Brasil, apesar das conquistas sociais da Constituição Federal de 1934, o Estado do Bem-Estar Social não chegou a se implantar no país, bem como no restante da América Latina e, na visão de Hobsbawn (apud Streck, 2004, p. 63) o Brasil seria “um monumento à negligência social.”
Ao compartilhar desta idéia, Bonavides ( 2004, p. 30) assinala que socialmente, o Brasil é o País mais injusto do mundo; por um paradoxo, sua riqueza fez seu povo mais pobre e suas elites mais ricas numa proporção de desigualdade que assombra cientistas sociais e juristas de todos os países.
No entanto, após o fim da ditadura militar e a implantação da democracia, chegou, também, ao território nacional o neoliberalismo com a idéia da globalização através de um discurso econômico e relativação da soberania estatal em um país endividado externamente e subjugado às cobranças de juros ferozes, dívida esta que, na visão de Bonavides (2004, p. 04) sufoca o contribuinte, empobrece o país, quebra o erário, esparge a decadência e a miséria no seio das classes sociais.
Com efeito, não se pode negar que a exclusão social assistida tem um de seus fatores na política neoliberal praticada quando o Estado passa a ver a economia com âmbito mundial em detrimento das necessidades sociais. Barroso (2001, p. 7) acrescenta que o “Estado passou a ser o guardião do lucro e da competitividade”
A realidade neoliberal que assola o país, acusa a impossibilidade de políticas públicas criminais e penitenciárias, vez que não se justificaria aos olhos dos investidores externos e dos grupos econômicos internacionais, o dispêndio de milhões na construção de penitenciarias para a execução penal digna que exige a própria legislação nacional.
A sociedade entoa o mesmo discurso quando se insurge contra a construção de presídios se faltam escolas e hospitais para atender a demanda e, desta forma, os reclusos são excluídos do sistema e olvidados sempre pelas políticas públicas. Na lúcida visão de Santos (2004, p. 83), a economia passa, então, a ser a detentora das linhas políticas e institucionais do país, sendo que, de um lado a Constituição Federal destaca as garantias fundamentais e os direitos individuais e sociais, de outro, as regras econômicas limitam o Estado a não praticar políticas públicas que garantam a eficácia desses direitos retratados na Constituição e na legislação infraconstitucional.
Irônico que o poder econômico ainda se aproveita economicamente da delinqüência que centrada na prisão, segundo Foucalt (1987, p. 232) representa um desvio de ilegalidade para os circuitos de lucro e de poder ilícitos da classe dominante, v.g., das empreiteiras de engenharia, firmas de segurança e equipamentos, dentre outros.
Deste modo, ante a ausência de políticas sérias e investimentos no sistema penitenciário brasileiro, as velhas e insalubres instalações penitenciárias, além daquelas superlotadas efetivamente não atingem o desiderato último da pena que é a ressocialização do indivíduo que, na maioria das vezes, sequer era socializado e sempre foi excluído socialmente pelo poder público.
Segundo Leal (2003, p. 40) não se pode ensinar no cativeiro a viver em liberdade, descabendo cogitar-se de ressocializar quem de regra nem sequer foi antes socializado. Na atualidade nacional, recolhem-se os presos a locais piores que os calabouços antigos, aglomeram-se pessoas em cubículos e retira-lhes a dignidade, animaliza, em cenário pior que o zoológico da cidade.
Se o aprisionamento em si com a constrição da liberdade do indivíduo já constitui medida drástica para qualquer ser humano, o seu enquadriculamento em celas coletivas e condições indignas, não difere dos antigos suplícios da Idade Média.
Importante destacar, ainda, que o indivíduo privado de sua liberdade temporariamente não se encontra privado de seus direitos garantidos constitucionalmente como a dignidade da pessoa humana.
Assinala Foucalt ( 1987, p. 215) que a passagem dos suplícios, com seus rituais de ostentação, com sua arte misturada à cerimônia do sofrimento, a penas de prisões enterradas em
Arquiteturas maciças, não é passagem a uma penalidade indiferenciada, abstrata e confusa; é a passagem de uma arte de punir a outra, não menos científica que ela. Mutação técnica.
Vivemos atualmente um retrocesso Arquitetural
, prova disto é o resgate do isolamento pensilvânico pelo RDD (Regime Disciplinar Diferenciado), através da solidão e do silencio do antigo e ineficaz modelo filadélfico.
Por outro lado, faltam as políticas públicas adequadas que o sistema econômico globalizado e subjugador do terceiro mundo não permite implantar em total menosprezo com o detento.
De fato, a reforma penitenciária nacional deve iniciar pela Arquitetura das prisões, conforme assinala Mirabete (2000, p. 248). Já se tem afirmado que uma autêntica reforma penitenciária deve começar pela Arquitetura das prisões. Entretanto, nos dias de hoje, no recinto das prisões, respira-se um ar de constrangimento, repressão e verdadeiro terror, agravado pela Arquitetura dos velhos presídios em que há confinamento de vários presos em celas pequenas, úmidas de tetos elevados e escassas luminosidade e ventilação, num ambiente que facilita não só o homossexualismo como o assalto sexual.
A Arquitetura de velhos presídios e cadeias públicas espalhados pelo país, efetivamente não se difere de um zoológico (as grades, o confinamento), com celas superlotadas de seres humanos em piores condições que os animais habitantes das jaulas do próprio zoológico, sem individualidade, respeito e subjugados aos presos mais fortes.
Interessante que desde o modelo panóptico não se evoluiu muito na Arquitetura prisional que continua com aquela conotação corretiva e disciplinar dos séculos passados, sendo que até a conotação utilitária através do trabalho foi abandonada diante da falta de oferecimento de trabalho aos detentos em muitos estabelecimentos prisionais. Pouco se evoluiu.
Para Zaffaroni: “La prisión o jaula es uma institución que se comporta como uma verdadera máquina deteriorante: genera uma patología cuya caratecterística más saliente es la regresión, lo que nos es difícil de explicar.” (1992, p. 52)




2 comentários:

  1. ESTOU ESTUDANDO VIOLÊNCIA E CRIMINALIZAÇÃO SOCIAL, E ESTE ARTIGO ME AJUDOU MUITO NA COMPREENÇÃO DA ARQUITETURA PRISIONAL E O HISTORICO DO SISTEMA PRISIONAL.
    UM TEXTO COM ÓTIMA LUCIDAÇÃO.

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    1. Muito bom o texto, estou fazendo uma pesquisa pra o meu TCC e tive uma grande ajuda com esse trabalho. Obrigado garota!

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